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O termo “retomada” foi cunhado
para marcar o reinício do cinema brasileiro, a partir de meados dos anos 1990. Mas
agora, passados 12 anos da paralisação total da produção (com o fim da
Embrafilme, em 1991) e dez anos da criação de novos mecanismos de financiamento
(a Lei do Audiovisual, em 1993), pode-se ampliar o sentido desse termo, afinal
a “retomada” não se limitou a este setor, tendo se estendido também à
distribuição e à exibição, marcando uma nova fase para o mercado de cinema como
um todo no país.
Nesse período, a produção de
filmes nacionais se renovou, aprimorou sua qualidade técnica e se democratizou,
permitindo que mais de 70 cineastas realizassem seus primeiros
longas-metragens. A distribuição também aprimorou seus mecanismos e soube
explorar, cada vez melhor, as formas de aumentar a penetração dos filmes no
mercado. Mas a locomotiva dessa expansão está no setor exibição, que, depois de
anos seguidos de fechamento de salas, voltou a investir de forma agressiva,
principalmente com entrada das redes de exibição estrangeiras no país (a partir
de 1997, quando foi inaugurado o primeiro cinema do estilo multiplex do Brasil).
Pelo lado da produção de
filmes nacionais, as formas de financiamento (que nos tempos da Embrafilme eram
diretas), tornaram-se indiretas, por intermédio de mecanismos de renúncia
fiscal. Também na distribuição do filme brasileiro a mudança foi profunda ao se
optar pelo abandono do modelo estatal e adotar-se a associação com distribuidoras
privadas, principalmente as estrangeiras, que também se beneficiaram de
mecanismos de incentivo fiscal. Do lado da exibição, entre 1997 e 2001 mais de
600 salas foram abertas no Brasil, com investimentos que chegaram a um valor
aproximado de US$ 240 milhões (US$ 210 milhões dos investidores estrangeiros e
US$ 30 milhões dos nacionais).
Com essa reestruturação da
oferta de salas, entre 1997 e 2002 o público total de cinema no Brasil pulou de
52 milhões para 90 milhões, um crescimento de 70%. Nesse mesmo período, o
público do cinema brasileiro, especificamente, saiu da casa de 2,5 milhões de
espectadores para 7 milhões, conquistando em torno de 10% do mercado.
Paralelamente, com os novos mecanismos
de produção e o aprimoramento dos mecanismos de distribuição, o filme
brasileiro mudou de cara, ganhando um forte e inédito investimento em áreas
antes deficientes como o roteiro, a formatação do projeto e mesmo os processos técnicos
de finalização. Entre 1995 e 2002, 200 longas-metragens foram produzidos no
país, com um investimento total de US$ 250 milhões. Esse salto de qualidade
capacitou recolocou o Brasil no cenário internacional de filmes, permitindo a
participação nos mais importantes festivais internacionais e ampliando sua
penetração no mercado externo.
Em seu próprio mercado, a
produção nacional estabeleceu parcerias que contribuíram para melhorar seu
posicionamento. Por intermédio do artigo 3º da Lei do Audiovisual, um
dispositivo que permite às grandes distribuidoras estrangeiras instaladas no
país (as chamadas majors) investirem
em produções nacionais e deduzirem esse investimento do imposto pago sobre a
remessa de lucros, o cinema brasileiro ganhou novas possibilidades de
co-produção e infra-estrutura de lançamentos.
Em resumo, o cinema começou
os anos 1990 com uma crise gravíssima, em que seus mecanismos de produção haviam
sido extintos e o parque cinematográfico se encontrava em decadência, e chegou
ao fim da década com a retomada da produção, a distribuição fortalecida e o
circuito de salas de cinema em grande expansão.
A criação da Agência
Nacional de Cinema (Ancine), em 2001, selou a solidificação institucional dessa
nova fase do cinema, com o fortalecimento de uma política cinematográfica, o
início da reorganização dos bancos de dados e a regulamentação do mercado que
havia sido abandonada. A Ancine foi imaginada como um instrumento para levar
adiante a afirmação do mercado cinematográfico no Brasil e buscar como meta a
autosustentabilidade da indústria de cinema no país. Sua estrutura foi
concebida para contemplar todos os setores da atividade, e não apenas a
produção. Pela primeira vez no Brasil estão sendo criados mecanismos de
incentivo à distribuição privada e também à exibição. A Ancine, enfim, inaugura
um novo período do cinema no Brasil.
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